Materiais de construção: como o programa de crédito para reforma de casas pode impactar o setor

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04/11/2025Referências
Materiais de construção: como o programa de crédito para reforma de casas pode impactar o setor

O Reforma Casa Brasil, programa de crédito para reforma de moradias anunciado pelo governo na segunda-feira, 20, tende a ocupar o vácuo deixado por uma tradicional linha de financiamento para compra de materiais de construção que foi suspensa pela Caixa Econômica Federal em 2019 e não voltou mais: o Construcard. A expectativa do setor é que a medida renove o fôlego das vendas de materiais, que esfriaram nos últimos meses em virtude dos juros altos. A comercialização desses itens depende de crédito, seja por meio de empréstimos pessoais, cartão de crédito ou demais alternativas - que estavam escassas.


O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção (Abramat), Paulo Engler, acredita que o novo programa pode dar uma guinada nas vendas do setor. “É algo extremamente positivo para o setor. Se deslanchar em novembro e dezembro, pode trazer alguma movimentação importante ainda este ano”, disse Engler. “Se o programa surtir o efeito previsto, talvez tenhamos de repensar novamente as projeções de vendas, mas agora para cima”, disse.


Em setembro, a Abramat reduziu a previsão de alta nas vendas do setor neste ano, diante da piora dos resultados no começo deste semestre. A expectativa é que a comercialização de materiais tenha um crescimento de apenas 1,8% em 2025, enquanto a projeção inicial era de avanço de 2,8%.


“O setor de construção está em um momento não muito positivo, bastante desafiador por causa dos juros altos”, disse o presidente da Associação dos Comerciantes de Material de Construção (Anamaco), Cássio Tucunduva, que representa as lojas. “Nos últimos dois meses, sentimos um movimento de retração nas vendas. O programa tem a total possibilidade de reverter isso. Então, vai ser de grande valia para as lojas e também para o consumidor.” A projeção da Anamaco é que o faturamento do varejo de materiais tenha uma alta de 2,6% em 2025.


O presidente executivo da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Fernando Guedes, avalia que o programa pode estimular uma cadeia produtiva ampla, que envolve desde pequenas lojas de materiais de construção até prestadores de serviços, profissionais autônomos e fabricantes desses itens. Terá também impacto sobre os empregos na construção, principalmente em regiões metropolitanas e cidades de médio porte. “Cada obra de reforma movimenta o comércio local e gera ocupação imediata. É um tipo de investimento que tem retorno social rápido, porque melhora o ambiente doméstico e devolve autoestima às famílias”, declarou.


Vácuo do Construcard


Os representantes da indústria e do comércio de materiais também destacaram a importância de os consumidores contarem novamente com uma opção específica de financiamento, que não existia mais desde o fim do Construcard. Por anos e anos, o Construcard foi a principal linha de financiamento a pessoas físicas para a construção, reforma ou ampliação de imóveis, com possibilidade de parcelar o pagamento em até 240 meses (12 anos).


Nos últimos anos em vigor, as taxas praticadas giravam em torno de 1,5% a 3% ao mês. Qualquer um podia solicitar o financiamento, desde que aprovado pela Caixa na análise de crédito. Mas ele acabou engavetado pela inadimplência alta, deixando um vácuo que não foi mais coberto.


“O Construcard sempre é relembrado, pois teve função importante para o setor lá trás. A população está há bastante tempo sem acesso a algo assim, principalmente as pessoas de menor renda”, disse o presidente da Abramat.


“Lá atrás, o Construcard foi um campeão de vendas da Caixa. Sustentou boa parte das vendas nas lojas de material de construção”, emendou o presidente da Anamaco. “O novo programa representa um restart para o setor. Teremos uma modalidade de financiamento que não esperávamos”.


Novo programa


A meta inicial do programa Reforma Casa Brasil é atingir 1,5 milhão de contratações, de acordo com dados do governo federal. Para isso, contará com R$ 30 bilhões do fundo social do pré-sal e outros R$ 10 bilhões da Caixa Econômica Federal, totalizando um orçamento de R$ 40 bilhões. O programa faz parte do “pacote de bondades” preparado pelo governo Lula com benefícios principalmente para a classe média, que será fundamental nas eleições presidenciais do ano que vem.


Os financiamentos vão de R$ 5 mil a R$ 30 mil, voltados para famílias da faixa 1 (renda até R$ 3,2 mil) e faixa 2 (renda até 9,6 mil). A taxa de juros para cada uma dessas faixas ficará na ordem de 1,17% ao mês a 1,95% ao mês, respectivamente. Já o prazo de pagamento é de até 60 meses (cinco anos). Este programa é voltado a famílias que já têm imóvel, mas enfrentam problemas estruturais ou de adequação. O valor das parcelas será limitado a 25% da renda familiar.


Com a nova linha de crédito, a expectativa é de avanço nas vendas, principalmente, de itens básicos (cimento, areia, tijolos e telhas), além de hidráulica e elétrica. “As pessoas vão querer ampliar a casa”, estimou Engler. Apesar do juro não ser pequeno, a expectativa do presidente da Abramat é que ele dê condições de compra, ao contrário dos juros do financiamento pessoal ou cartões de crédito, cujas taxas estão mais altas.


“A taxa do programa é alta, mas a impressão é que o valor a ser pago vai caber dentro do orçamento da família. No Brasil, o desemprego está baixo e houve crescimento de renda. Esses fatores, congregados, ajudarão as famílias a ter condição de pagar”, estimou Engler.


Porta para o endividamento


Apesar da animação do setor, o sócio da área de Direito Imobiliário do Demarest Advogados, Marc Stalder, diz que o programa pode representar mais uma porta de entrada para o endividamento da população, que já é alto.


“Do ponto de vista jurídico e regulatório, a iniciativa (...) revela mais um caminho para o endividamento da população, com passos para o comprometimento ainda maior do crédito decorrente da poupança, já tão combalido”, disse.


O advogado observou que ainda não está claro no programa se será necessário para o tomador do crédito demonstrar ser proprietário do imóvel ou não, nem se haverá exigência de alguma garantia, ainda que meramente formal, para liberação dos recursos pelo banco. “Resta aguardar para sabermos se terá efetividade por representar mais uma dívida que, ainda que subsidiada, terá de encontrar seu espaço no bolso dos muitos interessados já com a renda tão comprometida”, disse.


Stalder ressaltou ser importante acompanhar a regulamentação e a implementação prática do programa observando esses aspectos e detalhamentos, especialmente no que tange à segurança jurídica dos contratos de financiamento, à fiscalização das obras e da destinação dos recursos e à efetividade dos subsídios anunciados.

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